Segue abaixo sentença transitada em julgado, que reconheceu o vínculo empregatício de corretora de imóveis:
Reclamante:
ADÉLIA LÚCIA PASSOS DINIZ Reclamada:
MRV EMPREENDIMENTOS S.A. Processo n.º 0000401-62.2011.5.15.004
SENTENÇA
I
- RELATÓRIO
ADÉLIA
LÚCIA PASSOS DINIZ, já
qualificada na inicial, ajuizou reclamação
trabalhista em face de MRV
EMPREENDIMENTOS S.A., também qualificada, e em razão dos fatos articulados na inicial postulou
reconhecimento do vínculo de emprego, rescisão
indireta, horas extras,
domingos e feriados
laborados, intervalo
interjornadas, décimo terceiro
e férias vencidas, depósitos de fundo de garantia, verbas rescisórias, multas,
indenização por danos morais e honorários advocatícios.
Requereu, por fim, a concessão dos benefícios da Justiça gratuita. Atribuiu à causa
o valor de R$ 50.000,00 e juntou documentos.
Inconciliados.
Em audiência, a reclamada ofertou defesa
escrita com documentos, arguiu
preliminares de inépcia
da inicial e falta de interesse de agir. No mérito postulou
a improcedência dos pedidos da inicial.
Audiência de instrução, à fl. 241/243,
na qual foram colhidos os depoimentos do reclamante e de uma testemunha. A reclamada apresentou prova emprestada no tocante ao depoimento de sua
testemunha, sem oposição da reclamante. Sem outras provas, as partes
concordaram com o encerramento da instrução
processual.
Razões finais por memoriais pelo reclamante e
pela reclamada. Última proposta
conciliatória rejeitada.
É o relatório.
DECIDO.
II
– FUNDAMENTAÇÃO
Inépcia
O Processo Trabalhista rege-se pelo princípio
da simplicidade. Assim,
basta que a inicial contenha o pedido e uma breve
exposição dos fatos correspondente ao pedido (artigo 840 da CLT),
viabilizando o regular contraditório e a ampla defesa (artigo. 5°,
LV, da CF), bem como delimitando os limites da entrega da prestação
jurisdicional (princípio da adstrição - artigos 128 e 460 do CPC).
A reclamada sustenta
a inépcia da inicial no tocante ao pedido de reconhecimento
do vínculo de emprego.
No caso, contudo,
a existência de um contrato
de prestação de serviços entre
as partes não exclui
o interesse de agir da reclamante quanto ao reconhecimento do vínculo postulado. Também
não verifico qualquer
contradição já que a relação
de emprego rege-se pelo princípio da primazia da realidade.
Ademais disso, a presença, ou não, dos
requisitos do art. 2.ª e 3.ª da CLT deve ser
analisada juntamente com o mérito
da demanda e não autoriza
a extinção do feito
nos moldes pretendidos pela reclamada.
Assim, não restou prejudicado o direito do
exercício da ampla defesa e do
contraditório, bem como a entrega da prestação jurisdicional. Rejeito.
Vínculo de Emprego
A reclamante postulou
o reconhecimento do vínculo de emprego com a reclamada no interregno de 14/04/2008 a
03/09/2010, quando laborou sem registro em sua
CTPS na função de vendedora de imóvel.
A reclamada nega a existência
do vínculo de emprego no período citado, aduzindo
que neste interregno houve prestação de serviços autônoma
como corretora pela reclamante, na forma do artigo 722 e seguintes do CC, conforme
contrato juntado. Sustenta, ainda,
que no caso não estão presentes os requisitos celetistas para a configuração
da relação pretendida já que havia mera vinculação contratual entre as partes.
Admitida a prestação de serviços pela reclamada, mas alegada a
condição de autonomia a fim de afastar o vínculo de emprego, a ela cabia convencer o juízo
quanto à validade da substituição do contrato de trabalho pelo contrato de prestação serviços. Inteligência dos
artigos 818 da CLT e do art. 333, inciso II, do CPC.
Todavia, da análise
do conjunto probatório dos autos, verifica-se que a reclamada
não se desincumbiu desta prova, quanto à
autonomia e falta de pessoalidade da
prestação de serviço da reclamante.
De acordo com a Lei 6.530, de 12 de
Maio de 1978, a qual regulamenta a profissão de corretor de imóvel, tem-se que o
exercício desta profissão é permitido ao
possuidor de título de técnico de transações imobiliárias, ao qual compete
exercer a intermediação na compra, venda, permuta e locação de imóveis, podendo,
ainda, opinar quanto à comercialização imobiliária. Ainda, de conformidade com referida Lei, o
corretor de imóveis se inscreverá perante o Conselho Regional de Corretores de Imóveis, o “CRECI.
Assim, tem-se que o verdadeiro corretor de imóveis
autônomo, exerce diretamente a
atividade empresarial, o qual tem sua própria clientela e por meio de
imobiliárias ou outras
fontes do ramo traz a seu cliente
o bem pretendido, figura esta que não se
confunde com o trabalhador que intermedia mão de obra para vendas de imóveis à imobiliária, que detém o bem e o cliente.
Destarte, temos que o corretor
de imóveis autônomo
deve estar inscrito
junto ao CRECI e realizar sua
atividade empresarial com liberalidade, inexistindo assim a subordinação hierárquica ou jurídica,
sendo este requisito o marco diferenciador entre o verdadeiro corretor
de imóveis e o empregado, que como já mencionado
intermédia a venda, sem qualquer
autonomia, ou seja,
mediante dependência e subordinação.
Partindo-se destes pressupostos constato que a reclamante, quando iniciou a
prestação de serviços (14/04/2008) sequer
possuía inscrição junto ao CRECI, o que
ocorreu apenas em 17/12/2008, conforme documento de fl. 23 não impugnado pela reclamada.
Ora, na falta deste registro, evidente que a reclamante não poderia formalizar qualquer negociação por si própria,
a não ser por meio da reclamada. Assim, no
momento da contratação faltava o requisito indispensável para a caracterização da relação autônoma alegada, ficando
evidente, portanto, a dependência que a
reclamante possuía junto à ré para realizar a atividade de venda dos imóveis.
Ainda que a autora tenha obtido posteriormente tal registro a
situação não se modifica caso comprovada que a prestação
de serviços ocorria
sempre da mesma forma, ou seja, com subordinação,
pessoalidade e onerosidade.
E neste aspecto, os documentos juntados com a inicial e os
depoimentos das testemunhas ouvidas
permitem ao Juízo concluir que não havia mera
vinculação contratual entre as
partes mas sim a direção da prestação dos
serviços da reclamante pela
reclamada na forma do art. 2.º e 3.º da CLT.
A ré refutou que realizasse os controles dos plantões e escalas dos vendedores, aduzindo que “a definição de participação ou não em plantões, dias de trabalhão durante a semana ou finais de
semana eram combinados entre os corretores e
não com a Reclamada”.
Ocorre que com a inicial foram juntadas escalas de trabalho pré-determinadas realizadas pela própria
reclamada, conforme fls. 64/77. Apesar da testemunha ouvida pela reclamada por ocasião da prova emprestada (fl. 245/246), Sr. Eduardo
Simões, dizer que havia prévio debate para a fixação das escalas, os e-mails juntados às fls. 39/63 deixam transparecer exatamente o contrário, ou seja, que havia imposição da forma e do horário
de trabalho pela reclamada aos vendedores.
Consta dos e-mails a “obrigatoriedade” e a exigência do
cumprimento de plantões, o
comparecimento em reuniões e os planos de vendas. Estes documentos não foram impugnados e demonstram claramente que havia subordinação fática e jurídica
na forma de labor da reclamante.
Assim, o depoimento da testemunha Sr. Eduardo vai de encontro com as
provas juntadas aos autos. Suas afirmações, portanto, tem a nítida intenção de
favorecer à reclamada e devem ser
avaliadas com cautela, mesmo porque a testemunha
encontra-se com contrato em vigor com a ré.
No mais, a testemunha ouvida pela reclamante, Sra. Josiane confirmou
os fatos da inicial e precisamente se
pronunciou a respeito de todas as indagações do Juízo, sendo que suas afirmações corroboram a cobrança de
trabalho indicada nos e-mails
juntados com a inicial, vejamos (fl. 242):
“(...)
que a escala era fixada pelo gerente a qual não
poderia ser debatida pelos
vendedores; que não era possível troca com
colegas dos períodos da escala; que caso não cumprisse as escalas havia pena de suspensão e já presenciou a reclamante sendo suspensa por este motivo”
Esta testemunha também esclareceu sobre a obrigatoriedade de apresentam relatórios e fichas de
atendimento e repassá-las a reclamada semanalmente. Este fato evidencie o controle e fiscalização das atividades
por parte da reclamada. Segundo
esclareceu esta testemunha também havia fixação de metas de vendas e no caso de não atingi-las os vendedores
eram dispensados da ré.
Com relação ao pagamento das comissões, ao contrário do que sustentou
a ré, tal fato evidencia sim a onerosidade do trabalho. Ademais ficou
claro que havia a intermediação da ré
para que a reclamante recebesse o percentual pela venda realizada, já que a testemunha Sra. Josiane esclareceu que
“os vendedores recebiam cheques
dos clientes e os passava
para o gerente e depois
de 07 dias
eram devolvidos para os vendedores; que pelo que sabe não era
possível reduzir as comissões”.
Neste aspecto esclareço que a reclamada, na qualidade de construtora
dos imóveis, detinha todas as fichas
de vendas das unidades e poderia ter apresentado ao Juízo todos esses relatórios para a aferição
do valor e da forma
que as comissões eram pagas a reclamante.
Na falta destes documentos, presumo como verídica a assertiva da
testemunha de que não poderiam reduzir
a comissão pela venda. Era da ré a prova em sentido contrário, ou seja, de que acontecia
da reclamante reduzir
o seu percentual de
comissão fixado no contrato de fl. 185. Trata-se da aptidão da prova, que neste caso, pertencia indubitavelmente à ré, já que detentora de toda a documentação alusiva à venda dos apartamentos.
Como conseqüência da ausência desta documentação, presumo, ainda, como verídica a remuneração informada
pela testemunha da autora, no sentido de que a remuneração média era de R$ 3.500,00,
mesmo porque esta importância é
amparada pelas fichas de vendas juntadas com a
inicial.
E, além disso, o objeto social da reclamada é, dentre outros,: “incorporação,
construção e comercialização de imóveis próprios ou de terceiros” (fls. 204).
A atividade da reclamante era de
“vendedora de imóveis”, fato incontroverso.
Portanto, a reclamante ativava-se em atividade fim da reclamada e,
nesta circunstância, a subordinação do reclamante já é presumida.
Assim, não se pode chegar a outra conclusão senão a da presença dos elementos
característicos da relação
de emprego, na forma prevista
pela legislação celetista, cujas normas, pela natureza de
ordem pública, se sobrepõem à vontade das partes,
mesmo porque as provas produzidas em audiência foram ao encontro da tese exposta na inicial.
Com efeito, presentes os
requisitos do art. 2.º e 3.º da CLT, declaro a existência do vínculo de emprego entre as partes.
No tocante à modalidade de rescisão, a testemunha da reclamante comprovou
a tese da inicial quanto à configuração da situação prevista na alínea “g” do art.
483 da CLT. Reconheço, portanto, a
rescisão indireta do contrato de emprego.
Deverá a reclamada, no prazo de 15 dias do trânsito em julgado
anotar o contrato de emprego na CTPS da reclamante, fazendo constar a função vendedora
na data de 14/04/2008 a 03/09/2010 com o salário de R$ R$ 3.500,00. O
prazo terá início após a juntada
do documento pela
reclamante, com a
intimação da reclamada para
realizar a anotação.
Na inércia da reclamada, incidirá multa de R$ 500,00, que se
reverterá em favor do reclamante, devendo
a Secretaria efetuar
a anotação supra como se empregador
fosse (art. 39, § 1.º da CLT).
Verbas Rescisórias
Ausente a prova
da quitação das verbas pleiteadas (CLT, art. 464, 477 e CC, art.
320), e na falta de prova de outra dispensa
que não a presumida injusta,
cujo ônus incumbia à reclamada
(Súmula 212 do C. Tribunal Superior do Trabalho), são devidos, observando-se a integração do período do aviso
prévio: aviso prévio de 30 dias; 9/12
avos de décimo terceiro salário de 2010; 6/12 avos de férias de 2010/2010, acrescidas de 1/3; férias
integrais, de forma simples, do período
aquisitivo 2009/2010, acrescidas de 1/3.
Julgo procedente, ainda, o pagamento
do décimo terceiro
salário integral de 2009;
9/12 avos de décimo terceiro
salário de 2008 e férias
integrais, de forma dobrada
(CLT, artigo 137), do período aquisitivo 2008/2009.
Ausentes os depósitos do Fundo de Garantia, determino que a
reclamada comprove nos autos tais
depósitos do fundo de garantia mensal, de 8% sobre a remuneração e do acréscimo de 40% sobre todos os
depósitos, consoante os artigos 15 e 18 da Lei
8.036/90, sob pena de execução direta de tais valores (Código Civil, artigo
186), sem prejuízo da expedição de
ofício à CEF para cobrança da multa prevista no artigo 22 do mesmo diploma legal.
Nos termos da Súmula 389 do C. Tribunal Superior
do Trabalho e ante o não
fornecimento das guias para o recebimento do seguro desemprego, julgo procedente a indenização no valor
equivalente ao seguro desemprego.
Defiro, ainda, as multas do artigo 477, § 8 da CLT, pois até a presente
data não houve pagamento das verbas rescisórias. Esclareço que apesar
de impugnada a tese da existência do vínculo, o
entendimento da controvérsia para afastar a
incidência da multa aplicada foi revisto em razão do cancelamento da Súmula 351 do C. TST.
Indefiro, por outro lado, a aplicação da multa prevista no art. 467 da CLT já que as verbas rescisórias não eram
incontroversas em audiência.
Jornada de Trabalho
A reclamada impugnou em defesa a jornada de trabalho descrita na inicial
aduzindo que a reclamante não possuía controle de horário e que fixava o
seu próprio horário.
Faço consignar, contudo, que a excludente do art. 62, I, CLT somente
se aplica nos casos em que não é possível
o controle da jornada pela empregadora em virtude
das especificidades da prestação dos serviços, uma vez que é obrigação legal da empresa zelar
pelo horário de trabalho do reclamante, considerando as normas de ordem
pública da CLT e o direito fundamental do empregado à limitação de sua
jornada de trabalho (art. 7.º, XIII da CF).
No caso dos autos restou inequívoca a possibilidade deste controle,
tanto é que era a própria reclamada
quem realizava as escalas de trabalho e cobrava o cumprimento dos horários
conforme e-mails juntados.
Afastada a exceção argüida, era ônus da reclamada comprovar a
jornada contratual alegada, eis que a prova do horário de trabalho, consoante
o art. 74, § 2.° da CLT, se
faz pela juntada
dos cartões de entrada e saída do empregado, mormente
no caso da reclamada, que notoriamente possui
mais de dez empregados, conforme comprova a escala de trabalho de fl.
A omissão da reclamada quanto a esses controles de ponto, faz
emergir a presunção relativa de
veracidade do horário declinado na inicial, na forma da Súmula 338 do C. TST,
mesmo porque a única testemunha que tinha ciência do horário de trabalho da reclamante não confirmou a tese defensiva.
Desta forma, observados os limites da inicial, fixo a jornada da
reclamante como sendo das 08h00 às
18h00 de segunda a sábado e das 08h00 às 17h00
nos domingos e feriados, sempre com uma hora de intervalo.
Em razão da jornada fixada, condeno a reclamada ao pagamento das
horas extras realizadas pela
reclamante, observando-se os seguintes parâmetros:
Como a reclamante era comissionista pura, somente faz jus ao adicional de horas
extraordinárias, não às horas em si mesmas, eis que já pagas. Logo, deve-se observar o enunciado da Súmula n.
340 do C. TST.
Por conseguinte, são devidos a reclamante os adicionais das horas excedentes da 8ª diária e da 44ª semanal, observando-se os horários acima
fixados, conforme se apurar, sendo que as horas computadas
para o cálculo do módulo diário não o serão
para o do semanal, evitando-se, assim, dupla
condenação.
Julgo improcedente, por outro lado, o pedido de pagamento pela
supressão do intervalo interjornada haja vista que a pretensão
pelo recebimento se confunde, na realidade, com a ausência do repouso
semanal remunerado, o qual foi considerado
para fins da condenação nas horas extras postuladas.
No cálculo destas horas extras também deverá ser observado o seguinte:
a)
O enunciado da Súmula n. 340
do C. TST, inclusive no que diz respeito ao
divisor (o número de horas trabalhadas se extrai dos horários acima
fixados, frise-se);
b) Adicional
de 50% para as horas extras de segunda a sábado e de 100% para as laboradas nos domingos e feriados;
c)
Os dias efetivamente trabalhados.
Devidos, por habituais os adicionais das horas extras,
os reflexos nos DRS’s e feriados, nas
férias acrescidas de 1/3, nos 13ºs salários, no aviso prévio, no FGTS e na multa de 40% do FGTS.
Indenização por Danos Morais
O dano moral é caracterizado pela lesão aos direitos da
personalidade, como honra, dignidade,
imagem, etc (art. 5º, V e X, CF), que acarreta ao lesado, dor, sofrimento, tristeza, vexame, humilhação,
gerando ao causador do dano a obrigação de
indenizar (arts. 186 e 927 CC/02).
Ressalte-se, que pela própria natureza da lesão, não se exige a
prova específica do dano, eis que a ofensa aos direitos da personalidade faz presumir a mácula na esfera íntima do trabalhador, já que
não há como regra uma caracterização objetiva
dessa repercussão.
No caso dos autos a reclamante comprovou
a conduta ilícita
da reclamada que determinada o cumprimento de plantões
em ambientes de trabalho que afrontavam
sua dignidade já que sem condições mínimas
de segurança, higiene
ou mesmo infra-estrutura de
trabalho à reclamante.
Esta situação se consolidava nos dias em que deveria cumprir os chamados “plantões piratas”, que consistia em ficar sentada
em uma cadeira de plástico
com um guarda sol na calçada em frente à obra cuja venda deveria
intermediar à ré. Os locais não eram habitados
e as obras ainda não estavam acabadas.
Por isso não havia
banheiro, local com água potável e segurança para guarnecer a trabalhadora.
Ao contrário da tese da defesa, a participação nestes plantões não
era facultativa à autora. Segundo
esclareceu sua testemunha, e conforme comprovo pelo teor dos e- mails, era obrigatória a presença
nestes locais, segundo escala previamente fixada,
sob pena de suspensão pela reclamada.
Também ficou comprovada a violação ao direito social básico da reclamante, previsto no art. 6.° da CF. A
imposição de jornada sem descanso semanal
prejudicava, indubitavelmente, o
direito ao lazer
da reclamante. É
direito do
empregado e dever
do empregador observar
a limitação da jornada de trabalho. A conduta ativa de exigir,
reiteradamente, o trabalho
sem possibilitar o descanso na semana ofende à dignidade da
trabalhadora e seu direito de convívio familiar.
Enfim, todas as condutas ilícitas da ré causaram sim afronta aos
direitos da personalidade da
reclamante que premida da necessidade de seu sustento se submeteu à condições não sadias de trabalho, causando-lhe
inclusive angústia pela privação de
seu convívio com sua família e pela falta de segurança no seu trabalho.
No tocante ao arbitramento da indenização a ser paga pela reclamada,
a doutrina e a jurisprudência têm
sido quase que unânime em afirmar que na fixação do quantum devem ser observados alguns parâmetros, a saber:
a)a indenização não pode ser ínfima a ponto de fazer com que o agressor torne a
praticar ofensas morais destituídas de fundamento, simplesmente porque não acarreta significativo desfalque em
seu patrimônio pessoal.
b)a indenização não pode ser tamanha que permita ao agredido
enriquecer-se sem causa, o que
permitiria, em alguns casos, não o caso destes autos - a “exorbitância”
de indenizações com o beneplácito do Poder Judiciário,
pelo que também não se estaria
fazendo justiça em seu sentido mais amplo.
c)
para fins do arbitramento,
deve ser considerada a gravidade da conduta praticada
pelo agente agressor, de forma a aplicar a penalidade adequada à conduta praticada, além de se considerar a
publicidade da injúria atribuída à vitima.
d)
Por fim, com base nos
princípios gerais neminem laedere e restitutio in integrum albergados pelo art. 944 do CC, deve-se
prestigiar a restituição integral do dano causado pelo agente ofensor, haja
vista que a ninguém é lícito causar dano a outrem
(art. 186 e 927, CC).
Por todo o exposto, entende o Juízo que atende o princípio da
razoabilidade, tendo sido levada em conta a condição
de ofensor e ofendida, a fixação de indenização
por danos morais no valor de R$ 8.000,00 como compensação pela dano pessoal causado à vítima.
Justiça Gratuita
Defiro a reclamante
os benefícios da Justiça Gratuita,
na forma do art. 790, § 3º da
CLT, tendo em vista a declaração de pobreza juntada à fl. 27.
Indenização por
Danos Materiais e Honorários Advocatícios
Na Justiça do Trabalho a condenação em honorários advocatícios não decorre apenas da
sucumbência. A parte
deve estar assistida
pelo sindicato de sua
categoria e, ainda, comprovar percepção de salário inferior a dois
salários mínimos ou estar em situação
econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do seu sustento e de sua família (art. 14, § 1º, da Lei 5.584/70 e
S. 219 e 329/Tribunal Superior do
Trabalho, bem como OJ 305).
A reclamante não provou todos esses requisitos, já que está
assistido por advogado particular,
razão pela qual julgo improcedente o pedido de
honorários.
Com relação ao pedido de perdas e danos, com fulcro nos artigos 389
e 404, ambos do Código Civil, aplicáveis ao processo do trabalho por força do art. 769 da CLT, o
reclamante não trouxe aos autos o contrato firmado com seus advogados comprovando o percentual narrado
na inicial, razão pela qual julgo improcedente
o pedido.
Deduções
Na apuração do “quantum debeatur”, concernente às parcelas deferidas
nesta fundamentação, deverão ser deduzidas as quantias efetivamente pagas por
iguais títulos, durante o período de apuração, com
o objetivo de tornar defeso o
eventual enriquecimento sem causa da parte reclamante, razão pela qual,
de igual sorte, eventual
pagamento a maior em determinado mês será deduzido no mês superveniente. Para esse fim, em regular execução de
sentença, serão considerados tão somente os
valores constantes nos recibos existentes nos
autos, haja vista a ocorrência da preclusão da
faculdade de apresentação de novos
documentos.
Recolhimentos Fiscais
Nos termos do artigo 46 da Lei nº 8.541/92 e Súmula 368, II, do C.
Tribunal Superior do Trabalho a
reclamada é a responsável pela comprovação nos autos dos recolhimentos fiscais, acaso incidentes. Todavia, faculto à
mesma deduzir os valores respectivos do crédito
do reclamante, ficando
afastada a pretensão formulada na petição
inicial no sentido de que a reclamada responda pelo pagamento (OJ 363 do
C. Tribunal Superior do Trabalho).
Observe, também, a sistemática de apuração fiscal introduzida pela Medida Provisória 497, art. 20, que acrescentou o art. 12 -A à Lei nº 7.713 , de 22 de
dezembro de 1988.
Por fim, faço constar que os juros de mora não compõem
a base de cálculo do imposto de renda. Inteligência do §1º
do artigo 46 da Lei nº 8.541/92 e OJ n.ª 400
da SDI-1 do C. Tribunal Superior do Trabalho.
Recolhimentos Previdenciários
Quanto às contribuições previdenciárias, deverão ser observados os seguintes parâmetros:
a)
A reclamada será a responsável pelos recolhimentos das contribuições sociais que lhe digam respeito
e, também, daquelas
devidas pelo reclamante, incidentes sobre o valor da condenação (OJ 363 do C. Tribunal
Superior do Trabalho);
b)
Faculto à reclamada reter do
crédito do reclamante as importâncias relativas aos recolhimentos que lhe couberem, já que contribuinte
solidário (art. 195, CF) observando-se
o limite máximo do salário-de-contribuição, ficando afastada a pretensão no
sentido de que a ré responda pelo pagamento integral das contribuições;
c)
As contribuições sociais
incidem sobre as parcelas salariais reconhecidas nesta sentença, nos termos do artigo 28, da Lei n. 8.212/91 e
214, do Decreto n. 3048/99;
d)
As alíquotas serão as
previstas na lei;
e)
Apuração do
crédito previdenciário com base no regime de caixa, tendo em vista que o fato gerador do tributo é o
efetivo pagamento ao trabalhador (artigo. 195, I, “a”, da CF), observada
a alíquota própria
bem como o limite máximo do salário
de contribuição da época própria do pagamento.
III
- DISPOSITIVO
Em face do exposto,
nos autos da presente Reclamação Trabalhista ajuizada por
ADÉLIA LÚCIA
PASSOS DINIZ em face
de MRV EMPREENDIMENTOS S.A.,
DECIDO, nos termos da fundamentação:
Afastar a preliminar de inépcia argüidas pela reclamada.
No mérito, julgar PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados para reconhecer o vínculo de emprego entre
as partes e condenar a reclamada às
seguintes obrigações:
a)
De fazer:
Deverá a reclamada, no prazo de 15 dias do trânsito
em julgado anotar
o contrato de emprego na CTPS da reclamante, fazendo constar a função vendedora na data de 14/04/2008 a 03/09/2010 com o salário
de R$ R$ 3.500,00. O prazo
terá início após a juntada
do documento pela reclamante,
com a intimação da reclamada para realizar a
anotação.
Na inércia da reclamada, incidirá
multa de R$ 500,00, que se reverterá
em
favor do reclamante, devendo a Secretaria efetuar a anotação supra
como se empregador fosse (art. 39, §
1.º da CLT).
Ausentes os depósitos do Fundo de Garantia, determino que a reclamada comprove nos autos tais
depósitos do fundo de garantia mensal, de 8%
sobre a remuneração e do acréscimo de 40% sobre todos os depósitos, consoante os artigos 15 e 18 da Lei 8.036/90,
sob pena de execução direta
de tais valores (Código
Civil, artigo 186), sem prejuízo da expedição de ofício à CEF para cobrança da multa prevista no
artigo 22 do mesmo diploma legal.
b)
De Pagar:
-
Verbas rescisórias: aviso prévio de 30 dias; 9/12 avos de décimo terceiro salário de 2010; 6/12 avos de férias de 2010/2010, acrescidas de 1/3; férias integrais, de forma simples,
do período aquisitivo 2009/2010, acrescidas de 1/3;
-
Pagamento do décimo terceiro
salário integral de 2009; 9/12 avos de décimo
terceiro salário de 2008 e férias integrais, de forma dobrada (CLT, artigo 137), do período aquisitivo 2008/2009;
-
indenização no valor
equivalente ao seguro desemprego;
-
Multa prevista
no § 8.º do art. 477 da CLT;
-
adicionais das
horas excedentes da 8ª diária e da 44ª semanal, observando- se a jornada
fixada na fundamentação e os critérios ali fixados que fazem
parte integrante deste
dispositivo, com reflexos
nos DRS’s e feriados, nas férias acrescidas de 1/3, nos 13ºs salários, no aviso prévio,
no FGTS e na
multa de 40% do FGTS.
-
Indenização por danos morais
no valor de R$ 8.000,00.
Os valores serão
apurados em liquidação de sentença. Autorizo
a dedução dos valores pagos sob iguais títulos,
desde que já comprovados nos autos.
Na forma do artigo 883 da CLT, os juros de mora, “pro rata die”, deverão incidir
a partir do ajuizamento da ação, à razão de 1% ao mês, de forma simples,
sobre o valor da condenação atualizado monetariamente (Súmula 200 do Egrégio
Tribunal Superior do Trabalho).
Correção monetária na forma da lei, observando-se a Súmula 381 do Egrégio Tribunal Superior do Trabalho
para as parcelas com vencimentos mensais, na
forma do artigo 39, § 1º, da Lei 8.177/91. O valor arbitrado a título de
danos morais deverá ser corrigido na
forma da Súmula 362 do STJ.
Recolhimentos
fiscais e previdenciários deverão observar os parâmetros constantes da fundamentação.
Defiro a
reclamante os benefícios da Justiça Gratuita.
Custas, pela reclamada, no importe de R$ 1.200,00,
calculadas sobre o valor da condenação
ora fixado em R$ 60.000,00.
Intimem-se.
ROBERTA CONFETTI GATSIOS AMSTALDEN
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